30 março, 2007

||| Uma boa notícia, sobre Rowan Atkinson.
Sobre este post, escreve, por mail, o João Sousa André:

«É sem dúvida uma boa ideia o não-regresso de Mr. Bean. Se possível que ficasse em casa com outros parentes criados por Atkinson, como Johnny English. por outro lado seria ainda melhor que obrigasse as personagens de Blackadder a regressar, ao mesmo tempo que conseguisse colocar Ben Elton e Richard Curtis (os autores de Blackadder II, III e IV) a escrever de novo para as aventuras do inglês mais cunning que raposas professoras de cunning na Universidade de Oxford (palavras do próprio). Isso implicaria também o regresso de Stephen Fry, Hugh Laurie, Tony Robinson, Tim McKinnerny, Miranda Richardson e, com uma boa dose de sorte, Rick Mayall, Patsy Byrne e Jim Broadbent a uma das melhores séries de comédia inglesas de sempre. Mas essa notícia já não seria boa, seria das melhores do ano. Só com muita sorte poderíamos aspirar a tanto.»

||| Ainda a Ota.
Escreve Isabel Prata sobre a Ota (post Farto da Senhora de Fátima da Ota), por mail:

«Eu da OTA nada sei e espanto-me sempre com a quantidade de pessoas que têm as mais técnicas opiniões sobre tão técnico assunto. Por isso gostei de ler o primeiro parágrafo do post que lhe dedicou. Estragou tudo no começo do segundo, para além de que por todo o mundo civilizado nunca os aeroportos ficam dentro das cidades, Portugal tem 10 milhões de habitantes e Lisboa apenas 2. Eu para apanhar um avião ando 2 h de comboio mais não sei quanto tempo de taxi ou autocarro. Se quiser apanhar um avião antes das 9 ou 10 da manhã saio de Coimbra no expresso da RN das 2 da manhã. Se chegar depois das 20 h tenho que vir de expresso (que são horríveis, inseguros, desconfortáveis) e se chegar depois das 22 tenho que apanhar o expresso da meia noite e meia e chego a Coimbra depois das 3. Está a ver, isto é Portugal.»

||| Cataluny@.
Este cidadão, depois de vaguear por Buenos Aires, Ushuaia, Punta Arenas, Puerto Montt, Puerto Varas e Chiloé, entre outras minudências, regressa e diz «o meu blog faz três anos». Ele viaja tanto que não tem tempo para escrever.

||| A campanha.








Anteontem, de facto, ao passar pelo Marquês de Pombal, vi o cartaz do PNR sobre o «basta de imigração». Ao contrário do que dizem, não se trata de uma campanha racista, mas apenas xenófoba e imbecil. Mesmo assim, naquele instante mudei de cor.

Em resposta, escreve o Klatuu Niktos, por mail: «Meu caro senhor, se é uma campanha «racista» ou «xenófoba»... é uma diletância semântica irrelevante! O «cavalheiro» que dá rosto - quase humano - a esse partido comprado é uma criatura abjecta que não pode ter lugar numa sociedade democrática!Deixe-se de «branduras»... esses gajos, se tivessem poder para tal... também assariam judeus no Rossio.» Eu insisto: mudei de cor. Mudo sempre, quando vejo campanhas destas.

||| Fora do top ten.







A The Lancet elabora o top ten das substâncias mais perigosas: 1. heroína, 2. cocaína, 3. barbitúricos, 4. metadona, 5. álcool, 6. ketamina (anestésico), 7. benzodiazepina (ansiolíticos), 8. anfetaminas, 9. tabaco, 10. buprenorfina.
Portanto, a marijuana está em 11.º, se é que não sabiam. Praticamente fora de perigo.

||| Enquanto isso, no outro lado do mar.
No Brasil, Lula e o PT (sim, não são uma e a mesma coisa) vão lançar uma televisão pública para acabar de vez com o jornalismo de sarjeta. Da última vez que Lula pensou no assunto, expulsou do país o correspondente do The New York Times.
Escreve Guilherme Fiúza:

«O novo ministro da Justiça, Tarso Genro, cansou de alertar que a imprensa burguesa vive tentando boicotar o governo popular. Deve ser a tal conspiração da direita, para a qual alertou Delúbio Soares, quando recebeu as primeiras acusações de fraude contábil. A saída petista para essa injustiça é, como sempre, a pureza, ao melhor estilo Fórum de Porto Alegre: criar um canal só para as idéias certas. Burguês não entra.[...] O PT e o governo querem criar uma imprensa realmente livre. Onde tenham total liberdade para divulgar os press releases presidenciais sem um editor chato fazendo contestações impertinentes.»

29 março, 2007

||| Uma boa notícia.
Rowan Atkinson diz que Mr. Bean não regressará.

28 março, 2007

Um retrato.











O primeiro dos programas de António Barreto, na RTP, foi ontem emitido. Gostei muito de ver. E de ouvir, porque a voz de António Barreto confere mais credibilidade aos números, aos dados, às análises. Fazia falta esta série. O retrato é comovente e digno; aparece-nos pela frente um país que mudou mesmo, e que mudou definitivamente em alguns aspectos. Por isso, o retrato é comovente. O livro de Barreto sobre a década prodigiosa (os anos setenta-oitenta), publicado há uns bons anos, já dava conta dessas mudanças e convinha lê-lo. Na verdade, o que realmente não mudou grande coisa, de 1975 para cá, foi o discurso da politicagem. Como se verá nas próximas emissões da série, os números e os factos irão desmentir essa gente. O programa de António Barreto será o mais cruel desmentido dos profissionais do apocalipse e da política; não porque seja feito contra eles, claro que não. Mas porque é um trabalho sério, profundo e, ainda por cima, bem escrito, realizado e apresentado.

Grande Prémio.
João Barrento ganhou o Grande Prémio de Crónica da APE com o livro A Escala do Meu Mundo.

27 março, 2007

|||Ainda Salazar, Salazar!
«O ponto é este, e muito simples: os resultados não merecem análise. O que eles significam e representam é completamente indeterminado.» Obrigado, Pedro Magalhães. É isso mesmo.

||| Populismo.
Eu sei, populismo. Mas irrita, não irrita? É um verdadeiro casino royal à volta das empresas onde o Estado mete o dedo.

||| Salazar, Salazar.
Outra questão de vida ou morte, segundo parece: a recente vitória póstuma do dr. Salazar não é a primeira. Agradecia que os sociólogos não me maçassem tanto com questões ideológicas tão definitivas como a do triunfo do salazarismo através do televoto. Salazar ganhou o concurso porque é um concurso televisivo; e Cunhal ficou em segundo lugar porque é um concurso televisivo. Os militantes votaram. Mas no caso de Salazar há vários factores. Em primeiro lugar, contou o facto de não ter sido incluído na lista inicial da RTP, claro que contou – e claro que se tratou de censura involuntária. Em segundo lugar, foi tanta a gritaria contra o velho beirão, que as pessoas se irritaram. Em terceiro lugar, foi um voto de protesto (sei que é banal dizer isso, mas não há como fugir à questão). Tirar conclusões acerca de um concurso televisivo? Claro que pode fazer-se. Dá uma imagem do país? Dá. Perguntem às esquerdas que agora protestam o que fizeram de verdade para impedir essa imagem salazarenta do país.

Mas, fora isso, o caso mais surpreendente vinha no JN de domingo: uma repórter foi ao Parlamento perguntar aos deputados da nação em que figura eles votavam: “não responder foi a forma hábil e prudente de a maioria dos deputados evitar entrar em polémicas”, escreve a jornalista – ou, então, eleger o “povo português”... Ora, por que razão não respondeu a maioria dos deputados a essa pergunta simples e banal? Para não se comprometerem. Quase quinhentos anos depois da Inquisição, quarenta anos depois de Salazar, trinta anos depois do 25 de Abril, “não se comprometer” é ainda o melhor – por causa do medo. Por causa do receio em arriscar, em ter uma opinião (mesmo que errada, mesmo que depois se mude), em ser confrontado com outras opiniões.

||| Farto da Senhora de Fátima da Ota.
Como quase tudo o que exige respostas racionais entre nós, a questão da OTA é tratada como problema de fé. Há crentes de um e de outro lado. Sou um leigo, entendo pouquíssimo dessas questões técnicas que deviam estar presentes no debate. Compreendo as questões de fé ligadas à OTA, porque são idiotas; mas a contabilidade real de vantagens e desvantagens ainda não a vi. Murmura-se sobre estudos. Fui vê-los. Parece-me que aceitam a hipótese da OTA; mas há dúvidas noutros, há dúvidas. Haverá sempre dúvidas em questões de fé.
Pessoalmente, preferia um aeroporto ao pé da porta e não me apetece andar 50 kms para apanhar um avião para Madrid. Mas, se for na OTA, que ao menos seja decente o acesso, com comboios rápidos e cómodos ao pé da porta. Não me venham é com a ideia de que vamos concorrer com Madrid seja no que for excepto nos voos para o Brasil e, talvez, África. Tantas promessas de futuro lembram-me sempre a Expo, e o melhor que ficou da Expo não está na Expo – são estradas, viadutos, pontes que levam às proximidades da Expo. Portanto, sejam moderados e maneirinhos: precisamos de um novo aeroporto, provavelmente, mas não me venham com a questão da nacionalidade a propósito de duas pistas para Airbus 380 ou com a concorrência com Castela, a Eterna Rival. Façam as contas. Não se trata – não se pode tratar – de uma questão de fé. Ou de compromisso pessoal.

24 março, 2007

||| O cantinho do hooligan. O verdadeiro hooligan. Os belgas, 3.










Os rapazes estiveram bem.

23 março, 2007

||| O cantinho do hooligan. O verdadeiro hooligan. Os belgas, 2.









Os rapazes dos jornais, aqui, em vez de se indignarem com coisas sérias, puseram-se em bicos de pés, histéricos, protestando contra os belgas. Eu, se chegasse a Bruxelas, ou à minha cidade de Antuérpia, e fosse recebido por uma horda de repórteres que me cercavam, invectivavam e exigiam que eu falasse, quando – justamente – eu não queria falar, também os mandava à merda. Os belgas tinham o direito de não querer falar. Tinham o direito de ir para o hotel beber umas cervejas. Tinham o direito de não ser empurrados nem insultados. Mas não. Há sempre alguém que estraga tudo. Deixassem o dr. Madaíl protestar, que era função dele. Mas, entre nós, contaríamos anedotas sobre belgas.

||| O cantinho do hooligan. O verdadeiro hooligan. Os belgas, 1.










Peço desculpa por contrariar o tom geral de indignação patriótica, mas esse guarda-redes belga merece o meu aplauso particular: é um herói num país ligeiramente aborrecido (eu gosto muito de Antuérpia). Digamos que ele se distingue bravamente – pediu que dessem duro no Cristiano Ronaldo. E, para corrigir, lamento que ele não tenha dito: “Não, eu não pedi para castigarem unicamente o Ronaldo. Eu pedi para aniquilarem todos!” Isso é que era. Eu levantar-me-ia, aplaudindo. Num mundo em que todos fingem e lutam para serem mais palermas e sonsos do que o vizinho, esse guarda-redes de que esqueci o nome merece aplauso, palmadas nas costas – e que lhe paguemos uma cerveja. Bravo, rapaz! Tu contrarias essa imagem papalva dos belgas! Tu estás à nossa medida. Futebol e estalada, uma bela dupla. E tudo se acabava, indo a rapaziada jogar à bola – esmagando os belgas, leal e convenientemente.

22 março, 2007

||| Portugal na Estónia.
O português João Lopes Marques, que vive em Tallinn, é o novo cronista do Eesti Ekspressi, o principal jornal da Estónia. Já agora, em Maio será publicado o seu primeiro romance, O Homem que Queria ser Lindbergh.

Como se escreve na abertura desta crónica, «Alates tänasest lisandus Eesti Ekspressi veebi arvamuspesa püsikirjutajate hulka Eestis töötav Portugali ajakirjanik João Lopes Marques, kes esimeses loos arutleb Eesti imidži klišeede ja reaalsuse üle». Exactamente.

||| Mar pela proa.
Vai bonita a política portuguesa, vai. Nada que nos obrigue a fazer o discurso da virgem ofendida, muito moral e etéreo, sobre a maldade do mundo. Como escreve o Filipe N. V., «o juízo e o mal obedecem à mesma voz». Bom, evidentemente que há uma certa saudade da ordem que antes reinava no mundo da política, quando se identificavam os protagonistas sérios e alguma ideia pelo meio.

||| Lei do vazio.
Na Alemanha, um conflito de interpretações acerca de um caso de divórcio e violência doméstica. Vale a pena ler a notícia para, de seguida, reflectir sobre o disparate que vai pelo mundo fora.

||| Reordenar o mundo.
Os ecologistas e amigos dos animais pediram que este urso polar fosse executado no Zoo de Berlim. A razão: «Si una madre osa polar rechaza a su hijo, entonces creo que el zoo debería seguir los instintos de la naturaleza.» Os fascistóides querem sempre reordenar o mundo. Mas nunca se sabe, nunca se sabe.

||| Criacionismo.










A perspectiva mais radical do «criacionismo» desfaz-se num minuto. Por exemplo: acreditar que o mundo foi criado há exactamente 6000 anos significa esquecer que a cerveja foi inventada cerca de 2500 anos antes dessa data. É uma injustiça.

||| Coisas leves. Preferências, 4.








A vida não é só aborrecimentos.

||| Coisas leves. Preferências, 3.









Por vezes, imagino viagens ao volante.

||| Coisas leves. Preferências, 2.










Visto de outro ângulo. O único carro que vem nos meus sonhos.

||| Coisas leves. Preferências, 1.









O velho Saab, uma obsessão como qualquer outra.

20 março, 2007

||| Festa dos livros de poesia.

















No próximo dia 21, Dia Mundial da Poesia, na Casa Fernando Pessoa, das 11h00 à meia-noite, feira do livro de poesia: baratos e bons. Não faltar.

Outros pontos do programa: às 21h30, leitura de poemas com Maria do Rosário Pedreira, Eduardo Pitta, Fernando Pinto do Amaral, Pedro Mexia, Pedro Sena-Lino, Ana Marques Gastão, José Luís Tavares.
João Afonso e João Lucas, logo a seguir, cantam poetas portugueses.
Desde as 18h00, o quinteto de jazz Wishful Thinking no jardim da Casa.
Ao fim da noite, pela noite fora, uma ceia.

17 março, 2007

||| Mas nem tudo são más notícias.









Ao menos, salve-se o essencial: o humor. Mas também a pequena e saborosa vaidade. Isto sim, é um prémio.

||| O cantinho do hooligan. Uma desgraça nunca vem só.






Dizem-me que o FC Porto perdeu o jogo com o Sporting. Não dei fé. Parece-me, aliás, que nem jogou.
Ora, por que é que o FC Porto não jogou? Tenho, para mim, que só há duas respostas decentes para pergunta tão simples. Ou comeram, durante a tarde, qualquer coisa que os desorientou; ou se enganaram de estádio e julgavam que iam jogar com o Sporting da Ilha do Corvo. Para ser delicado, escolho a primeira hipótese, mas enfim.

16 março, 2007

||| A Origem das Espécies.
O Rerum Natura dá conta do crescendo criacionista entre nós. O debate sobre o intelligent design é o começo. Depois, por que não ensinar o criacionismo nas escolas, em alternativa à ciência?

||| A choldra.












Boa oportunidade, para rever (graças ao trabalho de Álvaro Matos na Hemeroteca de Lisboa) as páginas clássicas de A Choldra, o jornal dirigido por Eduardo Sousa nos anos vinte portugueses: semanário republicano de combate e de crítica à vida nacional. Uma amostra pode ver-se aqui.

||| Chocante.
O caso dos trabalhadores portugueses libertados em Espanha é muito chocante. Hoje, na rádio, ouvi vários testemunhos sobre o assunto, nenhum deles surpreendente, sobretudo de emigrantes que contavam as suas experiências em França, Espanha, Inglaterra ou Alemanha. Muitos deles viveram vidas de horror, em nome da família e dos filhos. Todos o sabíamos, todos o sabemos. Por isso se torna ainda mais urgente tratar bem os imigrantes que chegam a Portugal.
Ouvi várias vozes erguer-se «contra Espanha». Mas, salvo erro, a polícia «deteve 17 pessoas, 13 das quais também portuguesas». Conta o Público. Eu pergunto-me: porquê esse «também»? Também, como se fosse excepção? 13 entre 17 dos que entregavam os trabalhadores portugueses em Navarra são portugueses, seja de que designação tribal forem.
Portanto, nada de empurrar o pó para debaixo do tapete do vizinho. O nosso tapete está sujo. Indigno de ver-se, aliás, com as carrinhas de recrutamento a funcionarem em plena luz do dia no Norte do país.

15 março, 2007

||| O país sociológico.
O caso Andreia Elisabete dá conta do país. Na realidade, não merecia mais do que duas ou três metades de página na imprensa e uma notícia nos telejornais, mas o país sociológico anda assim há anos: dá a vida por casos que deviam ser resolvidos com decência e sem estes excessos de vingança e ressentimento. Por um lado, pobre país que delira com raptos, esperas nos tribunais, e com as televisões que estendem o microfone para a gritaria. Por outro lado, estranho que a ERC, sempre tão acomodada a opinar sobre tudo e mais alguma coisa e a gerir politicamente as suas próprias opiniões, não tenha ainda dito qualquer coisa, muito subtil, como «tratem isso com decência». O país sociológico vibra com a gritaria dos pobres e dos desprotegidos; a Caras dos pobres tem de ter miséria no lar, sangue na rua e exposição pública. E gente a gritar nos tribunais.

||| Prémio Camões, 3.
António Lobo Antunes não é uma surpresa para o Camões, embora o seu nome tenha circulado com pouca insistência. Não me parece nada escandaloso que lhe tenha sido atribuído o Prémio, distinguindo estes vinte livros, e a sua influência cada vez mais notória na forma de escrever em português. Por um lado, significa esse reconhecimento; por outro lado, trata de absorver o antigo enfant terrible (desculpem o lugar-comum) e reconhecer a sua importância para o cânone. Acho que o depois de Manual dos Inquisidores e com o período imediatamente a seguir, os livros de Lobo Antunes mereciam uma distinção assim.

||| Prémio Camões, 2.
Nós não nos entendemos nisso. Nós, quero dizer, portugueses e brasileiros. Lembro-me da atribuição do Camões a Rubem Fonseca, que sei que ficou comovido pelo prémio, mas a «comunidade de leitores» brasileira liga pouco a isso; Rubem publicou a sua magnífica antologia de contos logo a seguir e a Companhia das Letras não mencionou o Prémio na sua biografia – porque, de facto, lhe atribui pouca importância. O motivo até pode ser simples: o Jabuti, como o Portugal Telecom, dois prémios que agitam o Brasil e ganham páginas inteiras nos jornais, têm listas de finalistas e são discutidos por críticos e escritores, muito embora o seu valor pecuniário seja menor. Figurar na shortlist de cada um desses prémios é, já de si, uma distinção.
No caso do Camões, não se pode querer organizar um Cervantes só porque sim; Cervantes é uma figura absolutamente popular no universo hispânico – quanto a Camões, independentemente de ser uma figura tutelar da Língua e da nossa literatura, é pouco reconhecido no Brasil. E passa, portanto, por se tratar de um prémio português.

||| Prémio Camões, 1.
O prémio, atribuído anualmente, só tem realmente importância em Portugal. No Brasil, a importância do Jabuti (ou do Portugal Telecom, por exemplo) é infinitamente maior. Não é uma crítica nem um espalhafato; é uma constatação. A chamada «comunidade lusófona» não conseguiu, nestes vinte anos, impor o prémio como uma distinção cultural importante e houve momentos em que o Prémio Camões passou por ser um instrumento político, atribuído em sistema de rotatividade pelos países de Língua Portuguesa (excepto Cabo Verde, onde há um autor que o merece, mas que provavelmente nunca o terá; falo de João Vário, um poeta absolutamente notável da nossa língua). Estruturalmente, o Camões é um prémio conservador, mas creio que não poderia ser de outra maneira; visa, sobretudo, certificar o cânone literário.
Outro sentido teria se o Camões servisse para distinguir personalidades cujo trabalho não se confinasse ao meio literário, mas abrangesse também a ciência ou a música, por exemplo. Mas, assim, talvez não se chamasse Camões. De qualquer modo, seria pior se não existisse de todo.

14 março, 2007

||| Compromissos pessoais.
O ministro Mário Lino garante que a construção do aeroporto da Ota até determinado ano, de que agora me não recordo, será um compromisso pessoal. O ministro afirmou isso há uns dias, veio na imprensa, e Fernando Sobral retoma o assunto na sua coluna de hoje no Jornal de Negócios. Eu deixei passar na altura porque me pareceu um disparate. Nem tanto acerca do próprio aeroporto, cujo «argumentário» me parece vago e pouco justificado, mas acerca do «compromisso pessoal». A declaração é grave e desajustada; espera-se de um ministro que ele não assuma compromissos pessoais desta natureza. Compreende-se o que ele, no fundo, quer dizer – mas não se entende a natureza pessoal do compromisso. Sabemos a partir de agora que, mesmo que as contas derrapem, mesmo que seja dado como adquirido que a Ota não é boa solução, ainda que haja intervenção divina no curso das coisas humanas, o aeroporto da Ota é uma questão pessoal que o ministro Mário Lino tem com o país. Ora, isto não pode suceder assim. O país não quer saber dos motivos pessoais que animam o ministro das Obras Públicas; o país, digamos, quer ter a certeza de que a Ota é uma boa opção porque tem o direito e o dever de lutar pela boa aplicação dos seus dinheiros; o ministro não pode tratar o aeroporto como coisa sua nem pode esperar que todos nós respeitemos os seus compromissos pessoais. Dir-se-á que é um exagero, um modo de dizer. Mesmo assim.

13 março, 2007

||| Tempo, sempre o tempo.
Leio o blog de José Rentes de Carvalho. É um dos portugueses que aprecio e que gostava de ler mais.

«As [páginas dos jornais] da literatura leio-as por alto, mais força do hábito do que atraído pela possibilidade de que nelas encontre razões de entusiasmo. As que tratam da arte leio-as para me divertir, porque sempre me pareceu cómico de que haja quem tenha a nebulosidade como ganha-pão. “A sintaxe das cores reforça a coerência do conjunto, enquanto que a orientação das linhas claramente aponta para um misticismo subjacente, muito próximo do de Kandinsky.”
Leio isto num jornal da passada sexta-feira. Guardo as páginas de economia dos jornais de sábado e atiro o resto para o lixo.»

||| Lontano da Manaus.












Esta é a capa ada edição italiana de Longe de Manaus [Nuova Frontiera].

||| Eduardo Pitta, o blog.










Intriga em Família, é este o título do livro de Eduardo Pitta onde se reunem alguns dos textos do blog Da Literatura, de 2005 a 2007. Aí está uma oportunidade para ler, de seguida e em papel, um dos nossos melhores blogs. A edição é da Quasi.

||| Revista de blogs. Teoria da blogosfera.
«O Tiago Galvão não escreve desde 24 de Fevereiro. Querem ver que arranjou mulher?»
{No Complexidade e Contradição.}

||| Revista de blogs. Mais um liberal à moda antiga.
«No que se refere a estabelecimentos particulares, como restaurantes, cafés ou discotecas, o correcto seria o Estado não meter o bedelho. Tais espaços não são essenciais à vida humana nem à cidadania. Por outro lado, nada impede os não fumadores de se organizarem e criarem os seus próprios espaços de degustação e convívio. [...] Defendo apenas que, na prevalecente ausência de alternativas, se adequem os vícios privados à cortesia pública. Creio que não é menos liberal aquele que exiba esforços notórios para controlar os danos laterais do seu pessoal vício.»
{Rui Ângelo Araújo no Os Canhões de Navarone.}

||| Revista de blogs. Teoria da literatura.
«Estou prestes a terminar a 2ª versão do meu primeiro romance. Espero tê-la terminada antes do fim desta semana :). Depois será revista por alguém do meu círculo próximo. Muito próximo. Temos uma relação profissional enriquecedora, com muito trabalho de equipa. Ela diz-me que eu escrevo bem e eu digo-lhe que ela é bonita. São mentiras como estas que fazem girar o mundo.»
{No O Nascer do Sol.}

||| Revista de blogs. As coisas essenciais.
«Em tempos, fiz constar neste espaço a expressão da minha lástima pelo fim do diário A Capital. O meu desgosto prendia-se, essencialmente, com o fim da página semanal de xadrez mantida por Luís Santos. Não posso, pois, deixar de manifestar profundo agrado pelo regresso de Luís Santos à imprensa nacional, nas páginas do diário gratuito Diário Desportivo
{Alexandre Andrade no Um Blog Sobre Kleist.}

||| Revista de blogs. Para tudo há um João Baptista.
«Há coisas que se sabem como começam mas não como acabam. Os últimos dias sem acontecimentos retumbantes assistiram contudo ao anúncio de polícias concentradas e ao lançamento da hipótese de cruzamento de dados pessoais na função pública, assim como à promoção intensa do culto da personalidade. Esses elementos separados já mereceriam atenção. Juntos são motivo de apreensão. Até porque raramente são os criadores que usam a criatura. Para tudo há um João Baptista.»
{José Medeiros Ferreira, no Bicho Carpinteiro.}

||| Vaidade.












Les Deux Eaux de La Mer
e Un Ciel Trop Bleu são finalistas do Prix du Meilleur Polar Européen.

Entretanto, esta semana, sai em Itália Lontano da Manaus (Longe de Manaus), edição Nuova Frontiera.

12 março, 2007

||| Aleluia.
Boas notícias do Brasil: livros religiosos apresentaram queda de 16% na quantidade de obras editadas e de 4% no volume de livros vendidos.

Concentração de informações. Um exemplo-limite.
«A polícia federal dos Estados Unidos (FBI) consultou, sem um mandado que a autorizasse, chamadas de clientes de empresas telefónicas, sites acedidos por clientes de fornecedores de acesso à internet e transacções efectuadas por milhares de norte-americanos com os seus cartões de crédito, acusa um relatório oficial divulgado esta semana. A lei antiterrorismo Patriot Act permite ao FBI exigir que lhe seja fornecida informação privada sem ter autorização judicial para isso. Mas se pode aceder aos registos das comunicações, não pode conhecer o conteúdo dessas comunicações sem mais autorizações.» No Público de hoje.

11 março, 2007

||| Online.
















As entrevistas do Escrita em Dia (Antena Um) com Pedro Mexia (Prova de Vida, Diários 2004-2006, Tinta da China), com Luís Carmelo (E Deus Pegou-me pela Cintura, Guerra e Paz) e com Luís Cardoso (Requiem para o Navegador Solitário, Dom Quixote).

Os links servem ficheiros em versão .wma; para versões mp3 e realaudio, clicar aqui e escolher.

||| Brasil, 2010.
Lula ainda não formou governo em 2007, mas já se fala em candidato presidencial para 2010: «Durmo e acordo pensando em eleger meu sucessor», diz Lula. E diz um senador do PMDB a propósito das intenções de Lula: «Esse pessoal do PT só pensa em 2010. E sabe que o nosso grupo (PMDB do Senado) dificilmente apoiará um petista na sucessão de Lula. Então, quer fortalecer o PMDB da Câmara, que é caudatário do PT.» O que significa que o PMDB vai apresentar a sua factura a Lula (e, provavelmente, ao PT): o próximo candidato da coligação será do lamaçal, na altura em que até Garotinho apoia Lula e em que o PT se alia a Maluf para São Paulo.

PS: Olha, o Brasil vai construir um muro para se proteger do Paraguai...

||| Casa Fernando Pessoa, A Arca de Pessoa.
Na sexta-feira passada, ao fim da tarde, lançamento de A Arca de Pessoa: Novos Ensaios (publicado pelo Instituto de Ciências Sociais), edição de Stephen Dix e Jeronimo Pizarro. Apresentação de Eduardo Lourenço e Manuel Villaverde Cabral.
































1. A mesa: Stephen Dix, Eduardo Lourenço, Manuel Villaverde Cabral e Jerónimo Pizarro; 2. na assistência, Manuela Nogueira (sobrinha de Fernando Pessoa), o embaixador da Colômbia, Richard Zenith, Arnaldo Saraiva mais atrás; 3. Eduardo Lourenço; 4. Jeronimo Pizarro e, de costas, António Guerreiro; 5. Zenith, ao fundo Almeida Faria e Gastão Cruz; 6. sala cheia, e Filipa Melo sentou-se ao piano.

10 março, 2007

||| Primeiro dia.










Primeiro dia de praia do ano. Toalha, jornais, livros, as coisas do costume. E de repente, aquele cheiro de infância, ou adolescência – o de Nívea, o protector clássico. Olhei em volta, lá estava ele. Foi um bom prenúncio para a época balnear.

||| O cantinho do hooligan fora de horas.
Nelson Rodrigues dizia que «o verdadeiro adepto de futebol é aquele que está disposto a indignar-se a qualquer hora do dia ou da noite». De manhã, num café, vi o leitor de um jornal desportivo, furioso, amachucá-lo e atirá-lo para o lixo diante do ar surpreendido do empregado de mesa (e da minha gargalhada, apoiando). Daí a uns minutos, a respiração mais tranquila, segundo café e segunda Água das Pedras, ele respirava a harmonia da manhã. Fixou o jornal com melancolia, no caixote do lixo, mas desviou o olhar, satisfeito. Na verdade, tinha sido uma boa decisão.

||| Livros de São Miguel.










A livraria Solmar, de Ponta Delgada, São Miguel, já tem um blog. O José Carlos e a Helena animarão o endereço com notícias da livraria e, crê-se, imagens de quem passa por lá. O Albano Pimentel, se ainda estivesse entre nós, haveria de gostar de saber.

||| Vigilância, 2.
Há uma coisa insuportável, na blogosfera como nas relações entre pessoas: a falta de sentido de humor.

09 março, 2007

||| Vigilância.
De facto, quem me manda a mim dizer piadas que eu não sabia que eram machistas?

||| Médias baixas.
«Francisco José Viegas evoca a "média (oficial) de duas agressões por dia nas escolas portuguesas", como, sem dizê-lo assumidamente, se este fosse um número alto. Este é outra questão onde a demagogia abunda. Imaginemos que este número oficial peca por escasso. Se quiserem, multipliquem-no por 3, 5, ou 10. Continuará a ser um número baixo. Baixo se tivermos em conta a quantidade de pessoas que interage na escola todos os dias: somando os quase 1.700.000 estudantes (do nível pré-escolar ao ensino secundário, considerando os ensinos público e privado) aos cerca de 160 mil professores e 80 mil funcionários, são quase 2 milhões de pessoas, praticamente um quinto da população nacional, que convive nas cerca de 12.500 escolas do país -, o número de actos de violência por ano é surpreendentemente baixo.» [Hugo Mendes, no Peão, a propósito deste post.]

||| A questão europeia.








Recentemente, escutei (durante mais de uma hora) um discurso sobre o funcionamento da União, sobre a formação de maiorias, o poder franco-alemão, toda a geringonça que transforma em sujeito disfuncional qualquer especialista em direito comunitário. Coisas da diplomacia. Tremi de consideração e estou a ser sincero. Admito que seja um jogo (e um desafio) interessante de que não conheço as regras; admito, também, que as regras sejam dissimuladas. Quando a conversa segue por aí, procuro eslarecimentos mas sei que a minha opinião é fraca, será sempre pouco informada.
O que me preocupa, agora, na Europa, na União, seja o que for, é a tendência geral para a uniformização, tanto das leis como das leituras do passado. Sei que vou estar no comboio que partiu atrasado. A culpa não é só minha. É da minha Europa do sul, dos nossos hábitos incivilizados, da alimentação, do hábito de comer peixe, da nostalgia da sesta, da sombra dos jardins, da saudade que -- todo o ano -- tenho da praia, do queijo de São Jorge, da velocidade a que conduzo o carro. E é da preguiça, também. Às vezes parece-me congénita, mas só me culpo a mim. Vivi lá fora, sei que há diferenças; mas aquele discurso sobre «o modelo finlandês» é-me cada vez mais estranho, nunca vi que os meus conhecidos de Helsínquia ou de Rovaniemi ou de Turku fossem especialmente felizes ou, para ser sincero, mais felizes do que nós. Mesmo os hábitos de leitura na Islândia; invejo-os para nós, mas sei que anoitece cedo em Reykjavík (as livrarias são a última coisa a fechar no centro da cidade) e que, há uns anos, só se podia beber álcool ao fim-de-semana. Nós habituámo-nos a contar anedotas sobre o Salazar, a contar anedotas sobre o Samora, a rir das tragédias. Às vezes chego atrasado a uma reunião e peço desculpa, mas não devia. Não devia chegar atrasado, não devia sair da sala para fumar, não devia estar a meio da reunião a imaginar a cataplana de bacalhau. Não devia deixar para o dia seguinte. Não devia estar o ano inteiro à espera da praia. O discurso dos modernos é confrangedor, de qualquer modo, quando nos imaginam -- a todos -- a seguir o modelo finlandês. O milagre irlandês deixa-me indiferente, depois de ver que Dublin, a minha Dublin, se tornou irreconhecível, uma espécie de pesadelo de ficção científica, britanizada. Irrita-me a falta de cuidado, a falta de trabalho sério, a falta de respeito pelas leis, a facilidade com que se desculpa a preguiça. Mas sou preguiçoso, também. Tenho uma carga da velha Europa do Sul por todo o lado. Participei em muitas reuniões de uma multinacional para quem trabalhei durante década e meia. Eles eram ricos, poderosos, tomavam decisões, marcavam reuniões para o pequeno-almoço, às sete da manhã. Nós íamos, mas não estávamos felizes.
Acho que não sei bem o que quero da União. Acho que não sabemos bem o que queremos da União. Não quero o manual franco-alemão de História da Europa. Quero continuar a contar anedotas sobre Napoleão. Irrita-me que eles digam o que eu devo comer, em nome da segurança alimentar. No fundo, gosto de imperiais tomadas ao sol de Maio, que nunca mais vem. Descobri que tenho o meu termostato regulado pela Costa Rica. Sou pontual, mas irrita-me a ideologia da pontualidade. Trabalho muito, mas irrita-me a conversa sobre «trabalho e mais nada». Respeito as leis, mas irritam-me os arrumadinhos, conformadinhos, irrepreensíveis. De cada vez que leio o livro de David Landes (A Riqueza e a Pobreza das Nações), nunca sei bem onde fica a minha história. Sou uma coisa (sou «finlandês», às vezes), mas não acho que seja a única maneira de viver. Acho que a Europa, esta coisa, conforme está, ou nos transformará em todos iguais, nenhum diferente, ou, um dia, explodirá. Imagino umas vagas pessoas decidindo como vamos ser, como vamos vestir-nos, o que vamos ler. E imagino que, um dia, nada lhes escapará. Não gosto de teorias da conspiração (nem de astrologia, de tarot, de profecias de Nostradamus, de esoterismo), mas vejo os muros à nossa volta. Devíamos ser assim, ser saudáveis, fazer pilates, participar, perseguir os que fumam pela rua fora, mandar prender quem estaciona no passeio, criticar quem conta anedotas machistas, sexistas, racistas, sobre judeus ou surdos-mudos. Um dia vão mandar-nos deitar às dez da noite. E nós vamos. Mas uma parte de nós não vai. Não há-de ir.

||| Europa única.
A propósito do livro único de História da Europa, o Lutz (Quase em Português), menciona-me numa adenda de que não entendi o sentido. Mas recomenda-me que leia uns manuais escolares alemães para me surpreender «com o desassombro com que eles olham para um passado pouco edificante». Caro Lutz: nem preciso de lê-los de novo. Basta ler o que nós próprios escrevemos sobre a guerra colonial, por exemplo, ou sobre a história da Expansão. Infelizmente, o Lutz termina a adenda escorregando: «Já que estamos a fazer processos de intenções: No medo que aqui fala, oiço atrás do alegado pluralismo outra coisa: chauvinismo.» Pessoalmente, agradeço o processo de intenções, mas tem alvo errado. Terá de bater a outra porta.

Adenda: Outra nota, caro Lutz. A ideia de livro único não é a de manual único escolar. A ideia é ler toda a história europeia como se só houvesse Europa e não houvesse europeus. Depois, quando diz que é «falta de visão e coragem não ver o mérito e o exemplo neste empreendimento» (ah, longe de mim dar conselhos), interrogo-me sobre se li bem.

Adenda 2: Subscrevo inteiramente a opinião de José Medeiros Ferreira sobre o assunto.

08 março, 2007

||| Proibir, de novo.





É uma reacção desproporcionada mas justa.


Já agora, comentários ao post sobre mais proibições e a este sobre o Todo Poderoso:

«Duvido bastante que, de facto, aches comparável a proibição do fumo em restaurantes e a pseudo-proibição das cadeias de fast food. E duvido também que não tenhas, já recebido mails a manifestar o mesmo que agora digo, mas, pelo sim, pelo não, cá vai: o fumo nos restaurantes interfere não só com quem fuma (activamente), mas também com quem está à volta; e isso não acontece com as cadeias de fast food...» [Cristina Silva]
«Tem razão quanto ao Todo Poderoso. Às vezes eu já tinha (tenho) dificuldades com o Todo Poderoso propriamente dito, aquele que é suposto ser Todo Misericordioso e amar-nos incondicionalmente e dar uns palpites sobre como deveríamos viver a vida, sem se meterem picuinhices, o que só lhe fica bem, que tenho dificuldade em gerir o "olhar" deste último feito de inércia, mesquinhice, invejazinhas, dedos apontados e má gestão dos seus recursos, recursos esses que saem dos nossos bolsos... Estou feliz, no entanto, porque vou deixar de ter fumadoras no cabeleireiro! Só é pena que tenha que ser assim, mas como dizem os sábios: temos o que merecemos.» [Joana C. D.]

«Hás-de engasgar-te com essa merda do charuto. O mundo ficava mais limpo sem fumadores e sem panascas intelectuais como tu que têm a mania de serem snobs.» [alguém que assina Algermais]

«Não me parece que se justifique essa comparação entre o fumo do tabaco e as cadeias de fast-food, mas há, de verdade, alguma semelhança. O problema é que está provadíssimo que o uso do tabaco é prejudicial ao próprio e aos outros. Quanto ao resto, que refere do post Todo Poderoso estou completamente de acordo.» [Rui Martins]

||| O cantinho do hooligan. Ressabiado.










Dizem as crónicas desta noite que «Diego fez a vida negra aos defesas do Celta» e que, como se sabe, «Hugo Almeida saltou do banco, aos 65 minutos, para marcar o único golo do Werder Bremen frente ao Celta de Vigo». Diego foi vítima do molho holandês que Adriaanse deixou no Dragão; Hugo foi vítima da ressaca do molho holandês. Se há indemnização a pagar a alguém, eu só conheço esta: a de Adriaanse aos adeptos. Só as contas de Diego já dão para desequilibrar o saldo.

||| O cantinho do hooligan. Rapidamente.







«Merci à toutes et à tous pour votre fidélité. Très bonne soirée et à bientôt.» Sans rancune.

Via Adufe, um texto minucioso e delicioso do Sr. Bulhão Pato sobre a semântica e a Taça UEFA.

||| História da Europa.










A ideia (ah, que rica ideia!) de um livrinho único de História da Europa parece a de um catecismo com «FAQ about us». É o melhor dos mundos e já vejo, daqui, as crianças alemãs e portuguesas e polacas e espanholas e holandesas e italianas e checas a festejar versões comuns sobre tudo o que nos divide. Claro que já existe um modelo franco-alemão como inspiração (claro!), a servir de choucroute. Não é a defesa da Padeira de Alubarrota, contra os espanhóis, que me inquieta. Talvez exista um problema imediato com as invasões napoleónicas e com o jogo de alianças em que andámos metidos. Em geral, trata-se de uma operação de limpeza muito adequada. Ficaríamos todos felizes e unidos pela mesma constituição e pelo mesmo manual de história da Europa. Felizmente que os dinamarqueses, os suecos e os checos já disseram que não estão disponíveis, ao contrário da Espanha zapatera, muito limpinha e correcta, desejosa de mostrar que existe. Deixem-se de merdas. Que haja um manual sobre a Europa, distribuído pelas escolas para sensibilizar a criançada e explicar as instituições europeias, sim; mas pormo-nos de acordo uns com os outros e limparmos da História as vergonhas de cada um para que não haja ofendidos nem malandros, parece-me um exagero.

||| Simplex.
Uma história alemã no Algarve.

||| É bem feito.







Não sabia, erro meu: o On Bullshit, de Harry Frankfurt, já estava publicado em Portugal pela Livros de Areia com o título Da Treta [80 págs.].
[No Brasil, o título é Sobre Falar Merda, edição Intrínseca, 72 págs.].

07 março, 2007

||| Kontratempo.
O blog do Tiago Barbosa Ribeiro em aniversário.

||| Ah, Todo Poderoso.










Eu tinha insistido: está aí o cartão único, depois vem o cruzamento de dados, depois vem a vigilância alimentar, o controle do nosso tabaco, a suspeita sobre a nossa saúde, a inveja dos vizinhos, o controle do peso, os procedimentos administrativos sobre a obesidade e a vida saudável. Que era um exagerado. Que ninguém ia cruzar dados. Que não havia acesso.
Pois aqui está demonstrado, pelo João Gonçalves. E não, não é por causa de José Sócrates; não é por causa deste primeiro-ministro. É por causa dele, do Todo Poderoso, do Estado-Todo-Poderoso. E da gente que por lá anda.

PS - Já agora, ver este texto de Vasco Pulido Valente.

||| Brasil. Medo da opinião.
O lulismo, a guarda avançada dos intelectuais petistas e o ministério público delirante avançam contra delitos de opinião, como agora é cada vez mais costume. Desta vez, é o consagrado Ministério Público do Sergipe (é o procurador da República Paulo Gustavo Guedes Fontes, num estado agora do PT) que entrou com um processo na justiça contra Diogo Mainardi. Riam, riam, porque é coisa séria. Antes de contar uma piada sobre sergipanos, consultem os controladores de opinião, em Aracaju e em Brasília.
Ver também o texto de Reinaldo Azevedo.

||| O que nós somos é miudinhos.





O que nós somos é miudinhos; vejam bem: no Brasil, o orçamento para as obras e investimentos nos jogos Pan Americanos aumentou 684% em relação ao previsto. Significa que os gastos são oito vezes maiores do que o previsto. Que é isso? O Apedeuta pode ainda nem ter governo formado (já lá vão três meses...), ou pode até faltar papel para emitir passaportes, mas marca penaltis no Maracanã.

Entretanto, Nelson Jobim desistiu ontem de lutar pela presidência do PMDB. Mas ameaça ir ao congresso (em nome do Apedeuta, claro?). Todo o poder aos sovietes.

||| José Agostinho.










Poemas de José Agostinho Baptista ditos pelo António Cardoso Pinto, edição Assírio & Alvim.

||| Proibir, que bom.
Uma das teses é a de que esta Europa está sem guerras há bastante tempo; por isso, os Estados fazem guerra aos seus cidadãos. Querem estragar-lhes a vida, aos poucos. Eles descobriram que se pode morrer saudável. Pode ser absurdo como tese, claro, mas é assim.
Agora, depois da proibição do fumo em restaurantes, eu pergunto-me sobre o que leva os governos a não proibirem as cadeias de fast-food que são, manifestamente, prejudiciais à saúde?

||| O bom selvagem, 2.
Comentário de M. Isabel Prata sobre o post O Bom Selvagem, no A Aba de Heisenberg.
Como de costume, o Filipe N.V. na mouche.

||| Turquia.
Por causa dos gregos, a Turquia bloqueou o YouTube no país.

||| O cantinho do hooligan. Helton de serviço.
Há sempre um Helton desconhecido que espera por si, esta é a verdade. Nada a fazer e, se calhar, nada a dizer. Pelo menos eles ficaram a saber o que era uma trivela.

Eu sei que estavam à espera que eu comentasse, eu sei. Nas boas e más horas, cá estamos.

06 março, 2007

||| Ora aí está.









Outra leitura recente, entre o sério, a surpresa, o rigor e o hilariante: Harry G. Frankfurt, On Bullshit (Princeton University Press, já de 2005).

«One of the most salient features of our culture is that there is so much bullshit. Everyone knows this. Each of us contributes his share. But we tend to take the situation for granted. Most people are rather confident of their ability to recognize bullshit and to avoid being taken in by it. So the phenomenon has not aroused much deliberate concern. We have no clear understanding of what bullshit is, why there is so much of it, or what functions it serves.»
Muito apropriado aos tempos que correm.

||| Ficam melhores.

A Isabel, no Miss Pearls (como o Rodrigo M.D., aliás, já tinha feito – e acho que outros blogs antes ou depois) dá conta do extraordinário upgrade de Fátima Felgueiras em matéria de toucado. Miss Pearls acrescenta mesmo o fantástico poema de Nicolau Tolentino que nós estudávamos no liceu e que hoje os miúdos não conhecem («Arremete-lhe à cara e ao penteado./ Eis senão quando (caso nunca visto!)/ Sai-lhe o colchão de dentro do toucado!...»). Acontece que o upgrade de Fátima Felgueiras não se deve unicamente ao penteado – deve-se à idade e ao tempo. O tempo, todos o sabemos, subtraiu à presidente da câmara de Felgueiras o estilo local, muito usado entre Mirandela e a Lixa, por assim dizer. A idade é outra coisa: emprestou-lhe saber. Ou seja, aquilo que também pode significar know-how e não resulta apenas da intervenção de um personal stylist no Rio de Janeiro. Com a idade, as mulheres, felizmente, aprendem. E conhecem o seu preço.

PS – Normalmente, eu diria «ficam melhores, é o que é». Mas é que ficam.

05 março, 2007

||| Sullivan.












Acabado de ler, com atraso. Recomendo a quem não tem medo de ser «liberal à moda antiga»: Andrew Sullivan, The Conservative Soul. How We Lost It, How We Get it Back (Harper Collins).

||| Manga Ancha.











Publica-se em Marrocos, Casablanca, e é uma revista trilingue de e sobre literaturas espanhola, marroquina e portuguesa. É um casal espanhol -- ambos falam português -- que a faz, artesanalmente, furiosamente.

||| As preocupações dos sitiados.
O Paulo Gorjão cita esta curiosa declaração de Miguel Relvas («O PSD nunca terá de se preocupar com Paulo Portas.») que também pode ser um retrato do autismo do seu partido. O PSD, aliás, não tem de se preocupar com nada; basicamente, aos poucos, o PSD vai criando o seu próprio deserto privativo.

||| Brasil, miscelânea.
1. Nelson Jobim, que enquanto presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) se manifestou contra o impeachment de Lula porque tinha medo que o poder caísse na rua (na rua?), pode vir a ser o próximo presidente do PMDB. Não lhe bastava ter Sarney, Jader Barbalho e outros articuladores; Lula teria agora Jobim, que disputa o partido em polémica judicial contra Michel Temer. O que falta ao invisível PRI de Lula para ser PRI? Apenas o México. Surpresas, surpresas.

2. Lula, o antigo sindicalista do ABC, quer proibir o direito à greve em determinados sectores da administração pública. A ideia de Lula, o Apedeuta, é que «somente um governo de ex-sindicalistas tem condições de enviar ao Congresso uma proposta de legislação que pode proibir o direito a greve de alguns setores do funcionalismo». Enquanto vários juristas já classificaram a proposta inconstitucional, espera-se que os intelectuais de serviço no PT e na CUT (Central Única de Trabalhadores) venham em apoio. Todo o poder aos sovietes.

3. Notícia publicada no Estado de São Paulo (sem link): «O Ministério Público pediu judicialmente bloqueio de bens no montante de R$ 5,3 milhões do PT e de Gilberto Carvalho, secretário particular do presidente Lula, por suposto envolvimento em esquema de propinas que teria operado na área de transporte coletivo na administração Celso Daniel, prefeito de Santo André assassinado em 2002.»

||| Aliados.
O Eduardo Pitta talvez se surpreenda com o facto de «Ricardo Salgado, presidente do BES, e Fernando Rosas, dirigente do Bloco de Esquerda, [serem] aliados nesta guerra» [a da OPA sobre a PT]. É o Estado, Eduardo, o Grande Estado, o Todo Poderoso.

||| O bom selvagem.
Vai um grande protesto, pelo país fora, contra a violência sobre os professores. Justificadíssimo. Mas, como acontece ou tem acontecido em matéria de educação, isto já estava previsto. Durante anos, a «escola centrada no aluno» e os mestres das «ciências pedagógicas» transformaram criancinhas em monstros irresponsáveis, ignorantes e prepotentes. Houve, ao longo destes últimos vinte anos, centenas de casos de professores agredidos e impedidos de reagir. Quando uma reportagem televisiva mostrou – com imagens cruas – exemplos dessa violência exercida sobre professores pelos alunos do secundário, logo algumas boas consciências protestaram contra, imagine-se!, a captação dessas imagens; mas não contra a violência, contra «o estatuto do aluno» e outras alegrias do sistema escolar. [No ensino superior, a imagem também é alegre: portões fechados a cadeado (com aplauso do Magnífico Reitor de Coimbra, evidentemente), dirigentes associativos que defendem o direito ao «chumbo» porque «não há condições» para terminar o curso em «tempo normal», faculdades esventradas pelo abandono e cheias de lixo.]
A escola «centrada no aluno» é uma festa para os sentidos, mas pouco edificante quer em matéria disciplinar quer em matéria científica ou pedagógica, com técnicos do Ministério da Educação que têm das escolas uma vaga ideia ou apenas uma «recordação teórica».
Embora nada disso (nem a ideia dos «territórios socialmente problemáticos»), isoladamente, possa explicar uma média (oficial) de duas agressões por dia nas escolas portuguesas, é o sistema de protecção corporativa que está em causa. A escola quer ignorar palavras como «disciplina», «autoridade» e «recompensa». O aluno é o «bom selvagem». Está aí. Aguentem-no.

||| Ler, 2.











O novo romance de Luís Cardoso, Requiem para o Navegador Solitário (Dom Quixote). Timor, 1941, invasão de Timor pelo Japão, uma personagem a deixar saudades (Catarina), a fazenda Sacromonte, personagens a lembrar Somerset Maugham, tudo muito bem escrito. Um belíssimo romance.

||| Ler, 1.












Indispensável ler o novo livro de Pedro Mexia, Prova de Vida (edição Tinta da China). Diário, anotações, fragmentos, humor, literatura & cinema & música. A vida do Pedro, que não é só literatura e que, se fosse, valia a pena.