09 outubro, 2007

||| Queimar, 1.
Esclareçamos vários pormenores ao mesmo tempo. Queimar uma bandeira, como queimar uma efígie do rei de Espanha, ou do presidente dos EUA, ou do primeiro-ministro de Portugal, é um direito constitucional (nos EUA, por exemplo). Todos podemos queimar livros. Pepe Carvalho, o detective criado por Manuel Vázquez Montalbán, queimava livros na sua lareira de Vallvidrera – era um direito seu; os livros eram seus; ele queimava os livros generosamente, não para assassiná-los mas para defendê-los de um mundo que os não merecia. Chegou a andar quilómetros a pé (em El Balneario) a fim de comprar um livro para queimar condignamente. Esse era o seu cerimonial secreto.
Tanto me faz que queimem exemplares da Veja como pilhas de romances «com final infeliz» – mas o gesto já não é puramente literário. Lembra o empastelamento de jornais e, sim, lembra Berlim. Dizem-me que não são coisas comparáveis; é provável. Mas quem não quer ser comparado não faz coisas comparáveis. Que meia dúzia de populares, incentivados pelo PT, queimem exemplares da Veja não pode ser considerado crime; mas dá uma ideia do que fariam se tivessem poder para queimar livremente o que quisessem e quem quisessem.
[FJV]

Etiquetas: