10 novembro, 2006

|||Academia, 2.
Comentário, por mail, de João Sousa André ao post sobre ciências & letras:

«O seu post entra precisamente em algo que discuti incessantemente com colegas nos meus anos de universidade. Especialmente com colegas de áreas que não das ciências (sou de ciências, como pode imaginar, especificamente engenheiro químico). Argumentei frequentemente o mesmo que o Francisco faz no seu post: que os "cientistas" podiam discutir humanidades sem problemas - salvaguardando a profundidade dos conhecimentos - enquanto que os "humanistas" não conseguiam trilhar o caminho inverso. Os autores que referiu, bem como muitos outros, mostram até que ponto os cientistas procuraram outras áreas para se enriquecerem pessoalmente.
Em todo o caso, penso que haverá razões para este distanciamento para lá da "arrogância das Letras" que refere. Uma boa perte disso passará por um sistema de ensino que permite aos alunos de humanidades a fuga às ciências. Embora não esteja a par do actual sistema de ensino no secundário, penso que não andará muito longe da lógica de manter as disciplinas de português, filosofia e língua estrangeira para os alunos de ciência, enquanto que as disciplinas mais básicas da ciência (matemática, física, química, biologia) são removidas dos currículos dos alunos de letras/humanidades. É a velha questão do "ir para letras para fugir à matemática".
A fuga à matemática torna-se importante porque explica, em grande parte, a incompreensão relativamente à ciência. É complicado explicar a física quântica ou a teoria das cordas sem se recorrer à matemática. O conceito de universo que se expande mas é infinito também é contra-intuitivo. Contudo todas estas teorias caem bem se vistas de um ponto de vista matemático. A matemática é, portanto, a "língua" da ciência (e falo mesmo sob o ponto de vista da comunicação), pelo que é necessário dominá-la para compreender os conceitos científicos. Já as humanidades podem ser compreensíveis por quem fale a língua da conversa, seja ela o português, o inglês ou o latim. Os conceitos podem depois ser apreendidos sem necessidade de formação mais avançada.
Também por aqui surge um outro ponto que me ocupou muitas discussões durante alguns anos: a questão da interdisciplinariedade das diversas áreas do saber. Porque razão não deverão os alunos de ciências ter uma ou duas disciplinas de línguas (na prática já têm uma formação informal em inglês, devido ao peso desta língua na literatura científica), filosofia (que forneceria ferramentas para uma saudável discussão científica ou mesmo para uma maior abertura a outras ideias), literatura (para melhorar a escrita dos "cientistas") ou mesmo artes (desenvolveria o espírito criativo tão necessário à ciência)? Da mesma forma, porque não dar uns rudimentos de matemática mais avançada, química analítica e orgânica, física mecânica e electromagnética (nem entro no campo das partículas) ou de simples noções de biologia, especialmente ao nível dos organismos? O contacto entre as duas áreas aumentaria e, quem sabe, poderia melhorar o trabalho em ambos os campos.»
Também por aqui surge um outro ponto que me ocupou muitas discussões durante alguns anos: a questão da interdisciplinariedade das diversas áreas do saber. Porque razão não deverão os alunos de ciências ter uma ou duas disciplinas de línguas (na prática já têm uma formação informal em inglês, devido ao peso desta língua na literatura científica), filosofia (que forneceria ferramentas para uma saudável discussão científica ou mesmo para uma maior abertura a outras ideias), literatura (para melhorar a escrita dos "cientistas") ou mesmo artes (desenvolveria o espírito criativo tão necessário à ciência)? Da mesma forma, porque não dar uns rudimentos de matemática mais avançada, química analítica e orgânica, física mecânica e electromagnética (nem entro no campo das partículas) ou de simples noções de biologia, especialmente ao nível dos organismos? O contacto entre as duas áreas aumentaria e, quem sabe, poderia melhorar o trabalho em ambos os campos.