07 novembro, 2005

||| A ausência de República, 3.
Sobre as questões levantadas nos posts anteriores, escrevi há tempos dois textos no Jornal de Notícias -- um na altura da discussão sobre a lei de estrangeiros (de 2004) e outro durante o célebre arrastão de Carcavelos (já de 2005, portanto):

Desaprovando largamente a vinda de pretos e de emigrantes de Leste, sem falar dos brasileiros, os «portugueses» viveram os anos oitenta e noventa à sombra de muito do que os estrangeiros fizeram por eles – das auto-estradas à Expo98. Os «portugueses» não se incomodaram com o facto de milhares de trabalhadores africanos viverem em condições degradantes nos estaleiros do Alqueva, no lamaçal da Expo e nas encostas da Venda Nova. Apreciavam, até, o ponto de vista «étnico», com os bares caboverdianos e as discotecas angolanas, ou o serviço doméstico barato – mas nunca prestaram atenção (salvo quando eram atingidos) à espiral de violência que tomava conta dos subúrbios e lhes destruía os comboios de Sintra. Daí, passaram a olhar de viés os brasileiros: entre eles, os dentistas (que vieram tornar mais acessível o mercado) e os empregados de lojas e restaurantes (que atendiam melhor). Depois, vieram os emigrantes de Leste, que – mesmo sujeitos às mafias criminosas que andavam à solta pelo País – pela sua competência conquistaram lugares na construção civil, no serviço doméstico e na pequena indústria (muitos deles com qualificação superior). Texto completo aqui>>>>>>>>>>.

O presidente Sampaio foi à Cova da Moura. Devia ir mais vezes porque vivem lá portugueses e não pretos. E o presidente da Câmara da Amadora também. Se aquelas pessoas são portuguesas, são portuguesas – devem obedecer às nossas leis, ser tratados como cidadãos, presos se cometem crimes, hospitalizados se estão doentes, perseguidos se praticam excisão feminina, e os seus filhos educados nas escolas públicas. Essa é a lei que eu defendo. Se não são portugueses, devem comportar-se como estrangeiros e respeitar o país onde vivem até que decidam, de acordo com uma lei justa e generosa, optar pela nossa nacionalidade. E aos estrangeiros devemos também um pouco de atenção. Nós fomos estrangeiros em qualquer outro lugar da nossa vida. Isto não evita os arrastões, mas ajudará bastante. O pior racismo é o da iniquidade com que se permite a miséria. A pretos ou a brancos. Texto completo aqui>>>>>>>>>>.

3 Comments:

Blogger Luís Bonifácio said...

Se Portugal estivesse debaixo da pata do Bloco de Esquerda, você seria condecorado pelo primeiro texto e fuzilado a seguir por causa do segundo!

11:58 da tarde  
Blogger PR said...

as desculpas dos motins são várias: a falta de acolhimento dos emigrantes; o véu das crianças; os insultos dirigidos por ministros franceses à "escumalha" que rodeia paris;
todas estas questões são falsas e estéreis.

Se a europa se baseia no livre comércio de pessoas, mercadorias e IDEIAS, qual é a legitimidade que temos ao culpar os emigrantes? Os europeus não povoaram a américa do norte à procura do "american dream"?
E que legitimidade têm os emigrantes em culpar os franceses por não os saberem acolher? Há pouco mais de umas décadas, os franceses nunca sonhariam sequer em associar-se aos alemães, quanto mais a outros povos!

A questão advém, do meu ponto de vista, de uma lógica bem mais preocupante.

Porque emigram os africanos e os asiáticos e sul americanos para a europa?
à procura de melhores condições de vida. e com legitimidade, não fossemos nós portugueses- também nós tivemos (temos) a nossa diáspora;

Porque é que os emigrantes procuram melhores condições?
Porque não existem condições nos seus países de origem.

Porque é que os emigrantes PERCEPCIONAM que na europa e nos EUA existem melhores condições? porque nos seus países são bombardeados com culturas que não lhes pertencem, inculcadas à força, por uma espécie de evangelização de marketing.

E Porque é que não existem condições em áfrica?

Porque os termos de troca estão deteriorados;porque as suas riquezas naturais são absorvidas pelos países ocidentais; porque a nossa cultura é-lhes atirada sem respeito para com o seu passado; porque, politicamente, são comandados por indivíduos da mesma raça corrompidos pelo desejo de riqueza individual;

A génese do problema nem sequer é a globalização; a glob. é uma consequência da lógica de mercado.

e é este O problema do sec.XXI.

Localmente, e agora, é preciso sanar este conflito; o ministro terá de se demitir; as crianças devem ser autorizadas a usar o véu.

Mas o problema tem de ser atacado desconstruindo a própria ideia que temos de civilização ocidental. senão, os conflitos continuarão, noutro local, noutro tempo, à espera de um cabecilha que suba ao poder e dê consciência de classe a esta massa subnutrida de argumentos, ou que se gere uma contra-reacção, tomando como exemplo o passado anti-semitista da europa.

é perigoso, muito perigoso.


Pá, perdoa-me. sei que o escreverias de outra forma.
Mas comentar em blogs permite-me não ter cuidado com a construção do texto

Abraço

12:29 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

O espantoso é que alguém que escreve estes dois belíssimos e claros textos possa depois votar Cavaco, alguém que se marimbou para tudo isto e que é, em parte, causa disto.

5:05 da tarde  

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