08 novembro, 2006

||| Banca. [Actualizado]
João Salgueiro, presidente da Associação Portuguesa de Bancos, e Teixeira dos Santos, ministro das Finanças, acusam-se de peronistas e de arrogantes. Vamos e venhamos: são acusações fáceis. A banca e o governo sabem que é fácil acusar os bancos de ter uma atitude sabichona face ao fisco, às operações off shore e aos relatórios & contas; o governo e a banca sabem que uma perseguiçãozinha pública aos bancos cai bem no vasto mundo dos consumidores endividados à banca, cheios de crédito à habitação e de crédito pessoal mal parado. Depois das seguradoras, os bancos são outra bête noir do consumidor peronista ou populista. E há sempre essa «realidade» praticamente adquirida por todos: o público está endividado «mas os lucros da banca crescem» (versão Manuel Alegre e Francisco Louçã). Explicado assim às criancinhas, qualquer peronista tem o caminho aberto para perseguir a banca. Desta vez, porém, quer no «arredondamento dos juros», quer no «desconto dos cheques», quer nas despesas com operações financeiras, a associação dos bancos explicou-se bem: quem paga é o consumidor. Está certo. Ou seja, João Salgueiro «ameaçou que o sector poderá agravar o preço do dinheiro», o que -- lido assim -- é chantagem pura e simples. Contra quem? Daí a interrogação do liberal à moda antiga: e o indivíduo, o cidadão, vá lá? Quem vai pagar o que «não era para ser pago por nós» mas que sabíamos que era pago por nós?


Comentário de Mesquita Alves:

«A propósito desta polémica sobre os lucros da banca, há alguns aspectos, que na minha opinião merecem reflexão ponderada mas urgente:
Um cheque depositado na sua conta, se o mesmo tiver provisão, só terá o dinheiro disponível na sua conta 3,5 dias depois. Com a evolução que a informática da banca (excelente) tem tido (e o multibanco comprova-o) este lapso de tempo é inadmissível, e prejudica objectivamente empresas e particulares. É que, no dia seguinte de manhã, o dinheiro sai da conta de quem emitiu o cheque... Sou partidário da livre concorrência, mas esta não pode ter entraves desonestos. Assim, se eu achar caro o meu empréstimo à habitação e quiser passar para outro banco mais barato, sou confrontado com uma cláusula em letras pequeninas que me informa que a amortização antecipada é penalizada com uma taxa (difere entre bancos) que vai dos 3 aos 6% sobre o total do capital em dívida do empréstimo. O problema é que há uma concentração entre todos os bancos com esta cláusula, e eu não posso escolher um ou dois bancos que não a tenham. Feitas as contas, fica-me mais caro trocar de banco e obter a melhor taxa do banco mais barato. Lá se vai o mercado livre... enfim, a livre concorrência.
Outro aspecto que é extremamente nocivo e muito pouco ético, tem a ver com publicidade de spread de 0.75% (p ex) que vem na imprensa, e no dia que vai assinar o contrato (e com responsabilidades contratuais já assumidas perante terceiros, logo em situação de dependência), vê-se confrontado com um spread de 4 ou 5%, mas que baixa para 0,75% se cumprir uma serie de requesitos tipo ter ALD, seguros PPR, etc, etc, etc.
Ora se alguém, sem o querer, ficar desempregado (p.ex.), além da consequência financeira de tal situação, vê-se confrontado com a possibilidade de a sua prestação subir em flecha, porque devido a que a situação inesperada e desesperada, não o possibilitar a ter o tal ALD, PPR etc etc.»
A obrigatoriedade do seguro de vida é algo que num casal com 45 anos custa o equivalente a 8% do total das prestações pagas durante um ano. Tendo em conta que no empréstimo à habitação existe uma garantia real e inequívoca não será excessivo que toda a banca faça esta exigência? Não será desproporcionada?
Se eu, empresário, vender madeira, aço ou o que for, e no montante que for, recebo conforme o acordado a 30, 60 dias, etc., sem seguro de vida nem garantias reais. Por que carga de água a actividade bancária tem garantias francamente superiores ao resto das actividades? Obviamente que a hipoteca é imprescindível -- mas mais, porquê? É que, como se sabe, os seguros de vida são os mais rentáveis da actividade bancária e seguradora, e esta minha preocupação tem a ver com o facto de nos próximos 2/3 anos milhares de familias de vários escalões sociais irem sofrer muito devido ao aumento das taxas de juro, com o seguro de vida ainda a agravar a situação.
Se eu vender 20 toneladas de aço ao "Joaquim, Lda.", novo cliente que conquistei ontem, entrego-lhe a mercadoria e, se deus quiser, receberei no prazo acordado. Por que diabo é que nem eu nem milhares de empresários de qualquer outra actividade não cobramos despesas de dossier, os kms que fez o seu vendedor, avaliação do aço ou elaboração do dossiê para abertura de conta corrente? Por que motivo, para mim nunca explicado, a actividade bancária é a única que o faz, e está legalmente autorizada a fazê-lo? O grave problema é que todos os bancos o fazem, e portanto, não posso, ao abrigo da livre concorrência, escolher o melhor entre meia dúzia que não o façam. O problema dos ajustes ao 1/8 de ponto está hoje na ordem do dia, e ainda bem, mas penso que aqueles 5 problemas acima descritos são de urgente resolução.»