28 julho, 2006

||| A tortura sofrida durante anos.


















Maria João Pires vai viver para o Brasil -- para a Bahia. Opção sensata. Depois do massacre de Belgais, em Castelo Branco, onde gastou grande parte das suas energias e alguma da sua fortuna, a pianista decidiu ir viver para os arredores de Salvador. Eu acho que ela fez bem. Daqui a alguns anos se ouvirão os lamentos.
Há quem vá anotar esta saída de Maria João Pires com o habitual ressentimento -- «a Pátria que enxota os seus melhores filhos», «o país que não apoiou Belgais», etc. Não acho que valha a pena. É certo que havia um problema logístico com Belgais (era em Castelo Branco), mas nada justifica as sucessivas recusas em apoiar condignamente um projecto daquele valor num país insensível à música, onde os intelectuais nem sequer conseguem enumerar meia dúzia de compositores que conhecem. Esse é um ponto.
Mas o ressentimento que vai ouvir-se é mesquinho e insignificante, além de, como se sabe, improdutivo. Maria João Pires percebeu que não conseguia levar o seu projecto adiante -- e partiu. Quando menciona «a tortura sofrida durante anos», acho que se compreende. Se o projecto conseguir desenvolver-se em Salvador, tanto melhor -- para Salvador, para Maria João Pires e para a música. A pátria é o lugar onde se consegue viver. Onde cada um consegue fazer a sua casa de Belgais. E é assim. Em Salvador vive-se muito melhor.