||| Por que é que são pirosos os escritores portugueses quando escrevem sobre sexo? [Actualizado.]
Na generalidade, são mesmo. Há recolhas hilariantes de textos sobre o assunto. Serpentes que tentam entrar no búzio, mulheres que se vergam ao peso de uma espingarda de carne, marialvismos, imagens imbecis, coisas que nem o saudoso Dr. Fritz Kahn (no seu inestimável A Nossa Vida Sexual) teria coragem de imaginar. Inês Pedrosa coligiu em tempos, no O Independente, uma antologia genial. As metáforas para o sexo são quase sempre perigosas, desadequadas, inadequadas, ridículas, além de fornecerem abundante informação sobre misérias de que não queremos saber. Há vários motivos. A rapaziada desses livros não tem grande tesão. Escreve sobre sexo mas não quer escrever sobre sexo; quer fazer literatura, dar um ar elevado à coisa -- que tem uma dimensão metafórica, certamente, mas isso é com cada leitor. Melhor inventariar, então, metáforas -- e é uma foleirice. Depois, há outro problema: se os personagens e as personagens não têm um índice mínimo de tesão, como é que hão-de interpretar diálogos e situações que valham a pena? No way. Evidentemente que há que contar com a «síndrome da bolinha no canto», informando os incautos que se está a falar de sexo -- e, então, a regra de «retroceder no último momento»: suavizar a linguagem, esvaziar as frases, pulverizar aquela trapalhada. Na verdade, os personagens e as personagens desses romances têm um grande pudor: não fodem; limitam-se a ser observados por um coleccionador de metáforas ou um manobrador do Dicionário de Sinónimos dos Fenianos do Porto. Há vastíssimas catadupas de sugestões, simulações, complexos, armadilhas, confusões -- mas, digamos, uma ripada bem dada é coisa rara, muito rara. Não que seja necessário. Mas quando se quer levar a caneta por esses lugares (salvo seja), então que seja com grande categoria.
Ver o Estado Civil e o Memória Inventada, via Glória Fácil. E também o Miniscente.
O Francisco Trigo de Abreu resumiu o texto de Inês Pedrosa aqui e aqui (obrigado pelo link, Francisco)
A Origem das Espécies
We have no more beginnings. {George Steiner}
6 Comments:
Entre a subtileza de um fino, aristocrático, Mourão Ferreira, com as suas espadas vivificantes em olímpicos amplexos e as cruas marteladas de um Luís Pacheco, distribuídas a esmo, em catres esfacelados, haverá certamente uma técnica narrativa mais adequada. De resto, trata-se de matéria delicada, que não está acessível a qualquer operário das letras. Nem mesmo os nossos irmãos brasileiros, com toda a sua imaginação desatada, toda a sua natural desinibição, ampliada pelos tórridos calores tropicais, conseguem sair-se lá muito bem...
A verdade é que o Francisco José Viegas já levou uns quantos ao seu 'Livro Aberto'. Ossos do ofício ou... falta de tesão?
Há pior, muito pior. Nos tempos em que decidi ler uns livros do Paulo Coelho (dois: "Brida" e "As Valquírias"; não aguentei mais), quase morri de rir com uma descrição de sexo no "Brida".
Mas, pela positiva, e a título de exemplo, refiro Pedro Juan Gutiérrez e Patrícia Melo. Deve ser do calor...
E por isso que eu gosto do Bukowski...
Sempre às ordens (e o Longe de Manaus já não passa desta semana)...
Francisco Curate,
O Bukowski em termos de sexo é do melhor que há. No "Women" ela leva a coisa até aos limites. As cenas de sexo nele são realistas e duras e por isso têm o humor (ou a falta dele) que normalmente caracteriza o sexo real.
E ninguém o pode acusar de falta de tesão :))
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