20 setembro, 2005

||| A noite, o que é?, 50.
É de noite que as coisas vêm. As recordações, a folhagem rente aos muros, as obsessões, o ruído dos bichos, animais nocturnos. As coisas vêm. Nem é fácil nem é difícil. Apenas o que são: aromas, frutos, coisas perdidas e sem nome, despedaçadas, intensas, formidáveis, versos em prosa, diálogos, palavras cruzadas. Eu digo que as coisas vêm, mas não é verdade; são apenas marcas na pele, hábitos, nomes, enumerações. Não são memórias, sequer. São feridas, rumores, mais enumerações ainda, como resumos da vida inteira e que, com o passar do tempo, se podem transformar num pesadelo. Estou numa varanda, sentado, olho em frente: é um exercício de ficção rudimentar; o que vem à memória às vezes são coisas que não devia recordar, vindas do fundo da noite, quando a noite não tinha esta ordem, nem outra, nem nenhuma. E era só noite. Amável. Amável noite, amável sotaque, amável língua desconhecida, incerteza. Livros de palavras cruzadas comprados em papelarias de aeroporto, em quiosques de bairro.

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Á noite o silêncio, a escuridão, o sossego e a solidão instalam-se.
É a altura em que ficamos sós connosco, em que tudo de bom e de mau nos vem à cabeça...
Os nossos demónios e monstros atacam, os nossos piores receios não param de nos perseguir.
Mas a noite é também um dos momentos mais doces do dia, em que revemos as nossas memórias mais doces e queridas, em que escrevemos, lemos, ouvimos música, conversamos com os que nos são mais queridos (presentes ou ausentes).
Obrigado por partilhar a sua noite e os seus textos magníficos e cheios de actualidade.

7:04 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ana Leonor, tu queres e levar uma brelaitada, com esse comentarios de merda!

que grande cagada de blogue!

10:11 da tarde  

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